Hoje é o dia do Chico, do Chiquim, do Francisco, do cara de Assis, do
maluco que falava com os animais: dia de São Francisco de Assis.
Ele é um daqueles santos da igreja católica que sempre gostei. Talvez tenha sido influência do Zeffirelli, embora eu o tenha conhecido antes.
O fato é que ele, Santa Teresa Dávila e São João da Cruz foram seres
que me cativaram. E eles não me cativaram por serem católicos.
Eles me cativaram porque eles eram exatamente o oposto daquilo que a crença católica e até mesmo cristã pregava e ainda prega.
Francisco mostrou que Deus estava em tudo.
Teresa foi uma questionadora desde o dia em que entrou, contra a vontade, para um convento.
João da Cruz sofreu muito por olhar o mundo de maneira diferente.
Teresa e João da Cruz, literalmente, levitavam e por conta disto eram perseguidos.
Francisco não comungava com o padrão vigente da fé cristã e foi perseguido.
Zeffirelli apostou nesta visão diferenciada e fez o magnífico Irmão
Sol, Irmã Lua. No filme, Francisco é usado como um ser que mostra a
distância entre os ritos e maneiras exageradamente elaboradas da igreja e
a simplicidade de reconhecer naquilo que faz parte da vida diária a
presença da divindade. Valia mais o que era feito de coração e o altar
era composto por aquilo que cada um produzia, comia e usava. No lugar da
visão materialista e política do uso da religião, uma visão mais
espiritual, mais social (que nada mais é do que uma visão política
diferenciada!) e mais pessoal da religião. A distância de Francisco e
seus seguidores daqueles que se consideravam os verdadeiros mantenedores
da fé cristã é muito bem descrita numa cena simples, quando termina o
encontro de Francisco com o Papa. Veja o filme e tire as suas
conclusões.
Mas tanto Francisco, quanto Teresa e João são seres que
preferiram mostrar que a espiritualidade é algo muito maior do que
aquilo que a igreja pregava e impunha. Enquanto a igreja impunha uma
agenda materialista e extremamente política, onde o importante era a
arrecadação (e não por acaso a Santa Inquisição, que de santa nada
tinha, foi uma maneira esperta de arrecadar mais fundos para a igreja.
E, ao mesmo tempo, a Igreja arrecadava fundos acompanhando os
navegadores, não para abençoar as viagens, mas para obter lucros no
apoio às muitas lutas contra os povos locais.).
Francisco falava com
os animais, valorizava a vida simples, atraía os pobres, os camponeses,
os explorados pela igreja, pela nobreza e pela burguesia reinante,
pedia esmola e comida de casa em casa, rezava missas para o povo e
deixava que o povo fizesse parte da missa. A vida de Francisco foi dura e
oposta a tudo o que a igreja pregava. Ele não diferenciava quem
chegava, contanto que ajudasse com o que podia. Ele incomodou a igreja
da época por tentar ser ele mesmo e buscar o seu jeito específico de ver
a espiritualidade.
Teresa ficava horrorizada com os relatos
enviados por seu irmão. O irmão de Teresa fez parte dos navios que se
direcionavam para o Novo Mundo e fez parte das expedições que
massacravam índios com o apoio religioso. Os missionários ajudavam no
saque de todo tesouro que encontravam pelo caminho. A igreja enriquecia
com as navegações e alguns padres se arrependiam daquilo que faziam, mas
aí já era tarde, pois a cultura e os tesouros já estavam nos cofres da
igreja.
São João da Cruz era maltratado por seus pares religiosos,
era amarrado como cachorro e pegava alimento que jogavam no chão.
Escapou desta situação famélica graças ao apoio de um irmão religioso.
João reencontrou o conforto nos braços de Teresa. Quando os dois se
encontravam, eles flutuavam e as irmãs do convento escondiam tal fato
porque sabiam que aqueles dois poderiam ser condenados pela Santa
Inquisição. Estranho que a igreja não soubesse avaliar que aquilo era
espiritualidade e não obra do demônio.
São João da Cruz ficou
conhecido por usa voz, que podia ser ouvida muito longe. Cuidava dos
enfermos, mas padeceu muito. Foi um místico, um poeta e um pregador que
nunca se permitiu obter mais do que o sofrimento, a penúria e o escárnio
dos demais. Apesar de todo o seu sofrimento, foi capaz de realizar
coisas impressionantes para o seu tempo. A igreja teve dificuldade para
lidar com ele, notadamente certas ordens cristãs.
Teresa era judia.
Sua família era judia (os judeus eram perseguidos pela Santa Inquisição
pelo simples fato de serem excelentes comerciantes) e rica, mas teve que
aprender a viver de aparência para não chamar a atenção da igreja. Para
escaparem da Santa Inquisição os judeus inventaram o sinal da cruz
(assim pareceriam muito devotos aos olhos dos demais cristãos),
tornaram-se fidalgos (ou seja, viviam de aparência) e mandavam suas
filhas e alguns filhos para os conventos (pagando uma boa quantia para
terem os seus filhos nos conventos), além de trocarem os seus
sobrenomes. Teresa entrou para um convento (o pai a colocou lá porque
ela se apaixonou por um primo!) e brigou contra todos os conceitos do
convento, fazendo até saraus nada santos para a época. Depois ela
descobriu que toda vez que as freiras cantavam, ela entrava em êxtase e
flutuava. Nem por isto ela parou de questionar Deus. Brigava com ele o
tempo todo, mas abriu diversos conventos.
Estes três seres mostraram
para a Igreja da época quão vazio era tudo aquilo que ela valorizava e
quão distante ela estava das pessoas e da espiritualidade. Apesar de
tudo, as igrejas cristãs (claro que existem exceções) ainda não
aprenderam a valorizar a espiritualidade, preferindo a materialidade, o
apoio ao poder (não importando qual seja este poder) e a disseminação do
controle do exercício da fé, acreditando que tudo o que está de fora
dos padrões e dogmas deve ser execrado e destruído.
Teresa, João e
Francisco foram perseguidos pela igreja de seu tempo porque eles
possuíam poderes espirituais genuínos e os exerciam para o público (e
ensinavam coisas que poderiam colocar em risco os poderes da igreja,
porque as pessoas poderiam perceber que a igreja era vazia de poder
espiritual genuíno) e só não foram mortos porque houve intervenção de
poderosos amigos que acabaram convencendo que a igreja poderia usá-los
para atrair mais fiéis, mais dinheiro, sem, no entanto, afetar a fé como
era conduzida.
Será que os tempos de hoje são diferentes? Será que
Francisco, Teresa e João poderiam, ainda, ser perigosos para os
diversos segmentos cristãos dos dias de hoje? Será que os diversos
cultos, as diversas formas de ver a espiritualidade ainda incomodam os
principais líderes cristãos? Será que ainda hoje demonizam o que está
fora dos portões e permissões das igrejas cristãs? Se sim... quando
mudarão suas ações? Ou será necessário o nascimento de novos Franciscos,
Teresas e Joãos? Parece que o mundo evoluiu, mas certos setores ainda
não perceberam isto?
Talvez não seja o caso de mudar uma religião,
mas de fazer com que ela perceba que o seu impacto sobre o mundo pode
ser negativo quando ela tenta impor os seus dogmas a quem não a segue.
Fica a dica!
Sobre Marco Menezes
Trabalho, basicamente, com Tarot, Reiki, Numerologia e Astrologia. Sou formado em Farmácia pela UFRJ e lido com óleos essenciais, participei de workshops de florais com os principais co-criadores. Atualmente atendo somente online: via Telegram ou Skype. Este blog é apenas uma maneira de ver o mundo que nos cerca, com todas as nuances que for possível vê-lo. Sinta-se à vontade, mas respeite o espaço! ;)
04 outubro 2017
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