Quando
eu era estudante na Faculdade de Farmácia da UFRJ, tive a grata
surpresa de ter aula com um professor que era uma figura, mas era também
uma pessoa com um conhecimento profundo sobre a área que atuava:
professor Maulori Curié Cabral. Era final da década de 80 e a dengue
ainda era uma doença que estava começando a ser falada, mas ele foi direto
e claro sobre os problemas que teríamos aqui no Brasil (inclusive metia
o pau no Burle Marx por incentivar o plantio de bromélias, que, segundo
ele, só piorava a disseminação da doença) com o avanço da doença e
falava que o ciclo final da doença seria a morte. Ele desenhava até um
caixão, para dar um ar mais dramático ao seu jeito eloquente de falar.
Naquela época ninguém conhecia a dengue hemorrágica e ele alertou sobre
ela e o quanto ela seria nefasta para uma população que não tinha acesso
às informações e à Saúde Pública. Ele se baseava no que aconteceu (se
não estou enganado!) em Cuba, como sendo um local onde a epidemia de
dengue trouxe problemas. Tempos depois eu veria isto tudo acontecer no
Brasil, inclusive as mortes por dengue hemorrágica. Veja, a epidemis
teve no início do século XXI o seu auge e ele estava falando isso no
final da década de 80. Em outras palavras, apesar de todos os ministros e
secretários estaduais e municipais da Saúde, o Brasil não soube lidar
com algo que era previsível. As campanhas preferiram focar em colocar a
culpa na população e no vizinho, mas esqueceu de avisar que o governo
foi lento para tomar as medidas cabíveis que evitariam toda a dor que a
doença causaria às famílias.
Este
preâmbulo sobre a dengue é só para entrar num assunto que está mexendo
com as regiões Sudeste e Centro-Oeste: falta de água e, possível falta
de luz! Vamos lá, em primeiro lugar, já se sabia que os mananciais
estavam secando não é de hoje. Em segundo lugar, já se sabia que os
mananciais apresentavam problemas por conta da poluição. Em outras
palavras, as empresas responsáveis pelo abastecimento das cidades e os
governos federal, estadual e municipal sabiam que iriam enfrentar
problemas mais adiante. Junte-se a isso a irresponsabilidade dos
produtores rurais por não cuidar das nascentes e dos afluentes, sendo
que uma parte deles se esforçou para que leis mais brandas fossem
aprovadas isentando-os da responsabilidade de cuidados que seriam
importantes para a preservação de áreas de nascentes e de beira de
afluentes. Junte-se mais ainda: os governos estaduais e municipais,
sabendo do que viria, promoveram a venda da imagem de seus estados como
locais onde as empresas poderiam usar a água sem se preocupar. Bom, o
resultado final destas e de outras trapalhadas é que, agora, as empresas
e produtores rurais ficarão impedidos de crescerem e de programarem o
futuro, porque a água será cortada para eles em favor da população (bem,
é o que dizem!). A população será condenada a pagar preços altos e
multas pelo uso incorreto da água e, continuando este quadro, terá que
decidir se toma água e lava o corpo ou tem o que comer e se vestir (por
exemplo!), porque a produção dos bens de consumo será comprometida e
encarecerá (o mesmo ocorrerá com o consumo de eletricidade!). O mais
nefasto de tudo isso é que quem já não tinha água continuará a não ter,
pois é mais fácil para uma empresa do que para uma pessoa física obter
água. E se há tantos outros problemas que virão pela frente, caso não
mude o quadro, a pior coisa é saber que cada cidadão será culpado por
tudo o que aconteceu. basta dar uma olhada nos jornais e ouvir as
palavras que são ditas, sobre o assunto, nas mídias e percebe-se que
logo fica bem destacado o termo "será multado". Em outras palavras, a
população já é considerada previamente uma infratora, assim como o são
os motoristas que dirigem em alta velocidade, embriagados, drogados, um
assaltante, um assassino e tantos outros. A população vai pagar o pato
morto de sede pelo que não fez, afinal, a água e a eletricidade são
consideradas coisas indissociávies das atividades diárias, mas agora o
seu uso é rotulado como tendo que ser consciente e sustentável.
Mas quem
incentivou o consumo?
Mas quem disse que estava tudo bem?
Quem não fez
bem antes uma campanha realmente forte pelo consumo adequado de luz é
água?
Quem estava bem informado sobre o que iria acontecer: o governo ou
a população?
Quem não fez o dever de casa: o governo ou a população?
Quem não cuidou dos mananciais: o governo ou a população (neste caso,
vamos aceitar que ambos!)?
Quem, estando com todas as informações nas
mãos, não deu a mínima: o governo ou a população?
E quer saber? Caberia à
população mover uma ação contra a União pela incompetência generalizada
na gestão dos chamados recursos hídricos. E não só contra ela, mas
contra os governos estaduais e municipais, que foram incompetentes em
fazer o mínimo que se espera para garantir aos diversos setores as
condições básicas para existirem.
Sim, a população vai ter que se virar
para economizar e sim, a população será multada por gastar
indevidamente. Mas a população não foi corretamente informada e nem foi
corretamente orientada a fazer a sua parte. Não confundam campanhas
erráticas veiculadas nas emissoras de rádio e televisão com ações
afirmativas e realmente orientadoras, afinal, boa parte da população
acredita que está tudo bem e que nada vai afetá-la. Se uma campanha
nacional estivesse sendo feita desde anos atrás, muita coisa teria
mudado, desde as nascentes dos rios até o consumidor final e, talvez
hoje, só regiões como os desertos seriam caracteristicamente secos.
Mas
prefere-se esconder as cartas na manga até as traças terem ruído tudo e,
agora, só nos resta torcer pela água da chuva.
Santa incompetência!!
VAMOS
TORCER
OU SERMOS TORCIDOS? |
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